Autor: Jon Talber[1]
Publicado: 02 de Agosto de 2024
Os membros daquele núcleo por sua vez, apesar de se guiar pelas normas internas, normalmente o padrão instituído por uma autoridade maior, talvez os pais, individualmente, também são influenciados por pontos de vista adotados em outros núcleos, o que poderá muitas vezes gerar conflitos internos, dissonâncias pessoais, atritos pequenos ou grandes. Isso ocorre porque não há liberdade para que os indivíduos escolham por si mesmos, nem que conheçam uma segunda opinião, uma vez que são orientados a rejeitar qualquer argumento que não esteja em ressonância com o exemplo da matriz.
Internamente nunca se questiona se os membros estão individualmente satisfeitos. E há uma preocupação especial em cuidar da aparência ou estética que o grupo, como família, diante da opinião pública, deverá ter. Segundo essa abordagem, a família é na verdade movida pelos anseios, não dos seus membros, mas daquele que naturalmente se coloca como autoridade máxima dentro daquela comunidade. E nesse caso, consenso significa aceitação ou submissão a essa autoridade, e raramente, um acordo deliberado ou a concordância decidida em assembléia entre os membros.
Dentro da cultura tradicional, isso é uma coisa natural, uma vez que os filhos são formados psicologicamente a partir das próprias inclinações dos seus pais. E por automatismo ou ignorância, acreditam os pais, que seus herdeiros, são filiais psicológicas deles próprios. Daí o costume de decidirem até sobre as aspirações profissionais dos jovens, sem considerar uma consulta prévia ou estudo de suas idiossincrasias.
Desse modo, entre os pais, ainda é predominante o hábito de tentar determinar ou decretar as trilhas por onde seus herdeiros irão caminhar, até o inevitável advento do desmame paternal. No entanto, essa deliberação logo se mostrará como uma prerrogativa impossível de se realizar sem desvios. E da incapacidade dos pais de perceberem esse fato, entre os integrantes daquela comunidade surgirão os conflitos internos, pessoais ou existenciais.
Se esse fato, pela diversidade de opiniões deveria enriquecer ainda mais a experiência interna daquele núcleo, o que facultaria cada membro a ter mais opções de escolha, por ser aquilo um núcleo fechado, sujeito à apenas uma autoridade e regência, essa influência externa não é permitida. Assim, os componentes daquele grupo fechado, sufocados pelo crivo desse censor inflexível, na maioria das vezes, ficarão encurralados, e isso se torna então combustível para os inevitáveis atritos ou as Frustrações Existenciais patrocinadas por um sentimento de repressão capaz de se transformar em revolta.
Percebendo que a diversidade de pontos de vista poderia ser a base de uma experiência pessoal bem sucedida, os pais deveriam, ao invés de reprimir opiniões contrárias às suas, estimular o questionamento e os debates internos, tomando o cuidado de abrir mão do seu cetro autoritário. Em grupos de amigos e afinidades, auto-ajuda e equivalentes, a convivência entre opiniões divergentes é exatamente o fator de coesão e solidez dos integrantes.
Ali todos poderão ser escutados sem medo de repressão, embora isso não signifique que seus pontos de vista se tornarão referências consensuais, ou que estejam com a razão. Entretanto, o simples fato de cada membro dispor do direito à Liberdade de Expressão, já caracteriza uma possibilidade aumentada de convívio harmônico.
É quase certo que num ambiente assim, os filhos, de bom grado, dariam mais atenção aos conselhos dos seus pais. Não haveria então a necessidade de uma autoridade para reger, como se fora um monarca, as normas da casa, uma vez que a dúvida seguida pelo debate seria o melhor termômetro de união e consonância do grupo.
Tendo a liberdade de falar em casa, sem restrições ou condenações, filhos e filhas, teriam em seus pais sua fonte segura para tirar suas dúvidas, a despeito de toda influência do mundo exterior. Não se deixariam contaminar facilmente pelo apelo das drogas, dos maus hábitos, das posturas sociais desequilibradas, das más companhias, dos conselhos insanos, mesmo que partindo dos melhores amigos.
No entanto, ao se vestir como uma autoridade máxima, inflexível e muitas vezes inacessível, como é a postura da maioria dos pais, a motivação ao questionamento pessoal ou existencial nunca é estimulado. Da parte dos pais isso ocorre até como uma postura bisonha de proteger esse mesmo autoritarismo, que no fundo revela um imaturo e estúpido desejo oculto de sentir-se poderoso, capaz de dominar, a exemplo de um regente segurando às rédeas do seu regime monárquico.
Os pais pecam no momento em que se isolam dos filhos; quer dizer, ao excluírem de sua proposta de realização pessoal os demais membros da família. Sim, porque os pais, a despeito do cumprimento das obrigações familiares, possuem desejos individuais exclusivos, e na maioria das vezes, contrários aos do restante dos membros da casa.
Pelo fato de ter acompanhado o crescimento dos filhos, até por uma questão geográfica, já que compartilhavam do mesmo ambiente familiar, o que favorecia o contato mais íntimo, isso poderia servir de qualificação para que os pais fossem capazes de “traçar um perfil” psicológico fidedigno dos filhos, e isso incluiria saber quais são suas predisposições. Ocorre que eles demoram a aceitar o fato de que as crianças que viram nascer, psicologicamente, não existem mais.
Não são mais simples autômatos formatados para refletir eles próprios, disciplinados ou domesticados por medo de castigos, ou obedientes por força das gratificações. Até que ainda poderiam agir dessa forma, mas animicamente, certamente que são outros indivíduos, talvez ainda desconhecidos desses progenitores, cuidadores ainda obcecados com a ideia de que, para manter o poder de autoridade sobre a prole, a distância é coisa fundamental, sendo de fato, um item inegociável.
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Jon Talber - jontalber@gmail.com
É Pedagogo, Antropólogo e autor especializado em Educação Integral e Consciencial. É colaborador voluntário do nosso Site.
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